Comunidade acadêmica da UFCA se posiciona contra o Future-se por unanimidade em assembleia
Publicado em 21/08/2019. Atualizado em 31/10/2022 às 17h24
A comunidade acadêmica da Universidade Federal do Cariri (UFCA), reunida nesta quarta-feira, 21 de agosto, rejeitou, por unanimidade, em assembleia no campus Juazeiro do Norte, o programa Future-se. O projeto do Governo Federal, na visão do Ministério da Educação (MEC), teria como finalidade a autonomia financeira nas universidades e institutos federais por meio de incentivo à captação de recursos próprios e de parcerias com Organizações Sociais (OS). A minuta do programa encontra-se disponível para consulta pública até o dia 29 de agosto.
Iniciando as discussões, o Reitor da UFCA, professor Ricardo Ness, apresentou a proposta do Future-se. Em formato de projeto de lei, o documento ainda não é definitivo e deve passar por discussão e aprovação no Congresso Nacional, além de veto total ou parcial ou sanção pelo Presidente da República. “Não é o projeto definitivo e espero que não seja. A gente ainda tem muito o que discutir e abrir portas, com o MEC, com o ministro, a Sesu [Secretaria de Educação Superior] para mostrar o que a gente quer”, disse.
Na apresentação, Ricardo Ness mostrou que a intenção do Future-se seria fortalecer a autonomia administrativa e financeira da universidade, atuando nas atividades-fins (no caso da UFCA, ensino, pesquisa, extensão e cultura) e em áreas como internacionalização, governança, gestão de risco, controle interno e auditoria externa. Contando, para isso, com a participação das Organizações Sociais.
Dentre as atribuições que as Organizações
Sociais poderiam ter estão a gestão de imóveis da universidade, a cobrança de
matrículas e mensalidades de pós-graduação (especialização) e aluguéis, a
exploração de direitos e propriedade intelectual, a gestão de ganhos de capital
e até a contratação de professores. “A minuta demonstra fragilidade, pois
propõe a alteração de 17 leis para sua aprovação e não considera o artigo 207
da Constituição Federal sobre autonomia universitária”, ressaltou Ness.
Após a apresentação do projeto, o reitor sugeriu
duas propostas de posicionamento da assembleia geral: “rejeitar ou aceitar o
programa Future-se na forma como apresentado”. As propostas, no entanto, foram
criticadas pela comunidade acadêmica que se posicionou totalmente contra o
Future-se e considerou que não há diálogo com o projeto e nem com o Ministério
da Educação. “A gente tem que rejeitar o Future-se. Já foram cinco
universidades que rejeitaram no Brasil, a gente precisa tomar um posicionamento
contra o Future-se. Aqui [na UFCA] a gente não está negociando o Future-se”,
argumentou o professor Tiago Coutinho, representante dos docentes.
Depois de manifestações contrárias ao Future-se
por parte dos estudantes, professores, técnico-administrativos e até membros da
sociedade civil, as propostas foram modificadas para “rejeitar ou aceitar o
programa Future-se”. Todos os que estavam presentes votaram, por unanimidade,
na rejeição do programa. Como tem caráter apenas consultivo, a decisão da
assembleia será encaminhada ao Conselho Universitário (Consuni) para que seja
deliberada.
Críticas
Representando os docentes, Coutinho alertou para
os perigos do Future-se, principalmente para a perda do patrimônio da
universidade. “Aderir ao Future-se significa tornar o patrimônio da
universidade em fundo. A universidade então entra nesse fundo para concorrer a
recursos. É hipotecar os nossos recursos e entrar no livre comércio, que é
desigual. (…) A gente não conseguiu sustentar nossa participação dentro do
fundo, o que a gente tem que entregar? O nosso patrimônio”, explicou, lembrando
também que a gestão por Organização Social faz com que se perca todo o caráter
público da universidade.
Rodrigo Manfredini, estudante do curso de
Filosofia e representante dos discentes, criticou a forma como o projeto foi
apresentado pelo MEC, “de cima para baixo”, sem levar em consideração as
universidades e a própria sociedade civil. O estudante ressaltou que o
Future-se, em momento algum, aborda a questão da assistência e permanência dos
estudantes na universidade e questionou a presença das Organizações Sociais,
devido ao histórico dessas instituições no Brasil na área de saúde, por
exemplo. Na opinião dele, essas entidades, além de precarizar o trabalho dos
servidores, contribuíram para a corrupção.
Representante dos técnico-administrativos,
o servidor Wagner Pires fez críticas à lógica mercadológica do projeto.
“O Governo [Federal] quer colocar uma lógica em que tudo é transformado em
mercadoria. O conhecimento e a construção dele devem ser uma mercadoria? Devem
estar à venda por aí por alguns tostões? É isso que o Future-se é”,
questionou.
A Vice-Reitora, professora Laura Hévila,
ressaltou ainda a ausência da Extensão no projeto. Segundo ela, a palavra
extensão é encontrada apenas três vezes no documento. “Isso vem para nós com
muita preocupação, principalmente diante de um corte orçamentário gigantesco
que está atingindo nossas instituições”, disse.