Empresas Juniores são pauta de nova reportagem da série “Protagonismo Estudantil”

Publicado em 09/12/2024. Atualizado em 09/12/2024 às 11h54

Egressa do curso de engenharia civil da UFCA, Larissa Rocha é, atualmente, professora substituta da universidade. Foto: Davi Moreira - Dcom/UFCA

Em novo conteúdo, a série Protagonismo Estudantil narra experiências extracurriculares vividas por discentes e egressos da Universidade Federal do Cariri (UFCA) em Empresas Juniores (EJs). Em 2024, o Programa de Aprendizagem Cooperativa em Células Estudantis (Pacce) marcou o retorno das publicações da série produzida pela Diretoria de Comunicação (Dcom/UFCA). 

Para contexto, a primeira EJ do mundo surgiu em 1967 quando estudantes da L’École Supérieure des Sciences Economiques et Commerciales, na França, criaram a “Junior Enterprise”: uma empresa que preparava estudantes do ensino superior para a realidade empresarial da época. Exatos 20 anos depois, em 1987, na cidade de São Paulo, discentes de administração da Fundação Getúlio Vargas (FGV) fundaram a EJFGV – primeira iniciativa desse tipo na América Latina. 

Conforme a Lei 13.267, de 6 de abril de 2016, que regulamenta as empresas juniores no Brasil, essas iniciativas são consideradas associações civis sem fins lucrativos – ou seja, embora sejam chamadas de “empresas”, as EJs não são vistas dessa forma juridicamente.

O propósito das EJs é a realização de projetos e de serviços que contribuam para o desenvolvimento acadêmico e profissional de seus integrantes, por meio do incentivo ao empreendedorismo. Nesse sentido, a lei brasileira também exige que os estudantes sejam amparados por professores-tutores. Esses docentes, por sua vez, acompanham o aprendizado e a evolução dos discentes nas EJs.

Egresso do curso de administração da UFCA, Dhefesson Morais é um dos exemplos de pessoas que participaram de uma empresa júnior durante a formação acadêmica. Em 2019, ele ingressou na Premium Consultoria – EJ ainda em funcionamento na universidade e ligada aos cursos de administração e ciências contábeis da UFCA.

Dhefesson Morais, egresso do curso de administração da UFCA e ex-presidente da Premium Consultoria. Foto: Davi Moreira – Dcom/UFCA

Fundada em 2015, a Premium Consultoria foi a primeira iniciativa desse tipo criada na universidade. Além dela, existem na UFCA outras seis empresas juniores: Agir Consultoria (biblioteconomia), Calang.io (ciência da computação), Práxis Pública (administração pública e gestão social), Projetta Jr (engenharia civil), Promus (música) e Solucionare (engenharia de materiais).

Dhefesson relembra que já conhecia a Premium Consultoria quando entrou na universidade, em 2018. Inicialmente, ele conta que passou a integrar a equipe da Premium como trainee. Originário da língua inglesa, o termo designa um tipo de cargo no qual, antes da efetiva contratação, o profissional passa por um período de treinamento. Após essa etapa, Dhefesson se tornou consultor e, nos seus últimos dois anos de empresa, assumiu o cargo de presidente. 

“É um momento de aprendizado, onde você tem o acompanhamento de pessoas que já estão lá há mais tempo e essa é uma das grandes vantagens do programa, porque, desde o momento em que você ingressa [em uma EJ], você já tem a oportunidade de conversar e compartilhar conhecimento com pessoas que estão em períodos letivos totalmente diferentes. Isso favorece não só a atuação dentro dos projetos de consultoria  como também o conhecimento acadêmico”, relembra Dhefesson sobre o seu período como trainee na Premium.

Os treinamentos realizados durante a etapa de trainee – conforme acrescenta Dhefesson – favorecem a atuação dos discentes nas EJs, pois é durante essa etapa que os estudantes podem demonstrar habilidades que já possuem e destacar quais desejam desenvolver. 

Dhefesson se formou em 2022 e, para ele, a grande vantagem em ter participado da Premium foi poder aplicar, na prática, conteúdos e teorias vistas dentro de sala de aula. A sala de aula, ainda segundo Dhefesson, é um ambiente mais controlado e não possibilita vivenciar todas as nuances existentes no mercado de trabalho – possibilidade que ele encontrou na Premium.

O ex-presidente da Premium Consultoria reforça que quem participa de uma EJ aprende, primeiramente, a ser “líder de si”, além de fortalecer competências e habilidades como comunicação, liderança e trabalho em equipe: “Depois que você se desenvolve como líder de si mesmo, você passa a desenvolver habilidades para ser líder do outro, liderar equipes, gerenciar projetos e promover [atividades para] que a equipe cresça com você. Isso não é algo que você aprende na sala de aula: você precisa vivenciar”, finalizou.

O egresso de administração também evidencia a importância das empresas juniores para o Cariri. Ele afirmou que é a partir das atividades exercidas nas EJs que os recém-formados saem mais preparados para o mercado de trabalho e isso, consequentemente, favorece as empresas e a economia da região. 

Como criar uma empresa júnior

O processo de criação de uma empresa júnior requer o desenvolvimento de documentos importantes, como o estatuto social. O estatuto reúne informações sobre as características e as definições da empresa – tais quais direitos e deveres dos associados, requisitos para admissão e desligamento de seus participantes, fontes de recursos financeiros para manutenção da empresa e detalhes sobre a sede da EJ.

A aprovação do estatuto deve ser feita por meio de assembleias, nas quais serão debatidas as principais diretrizes que a empresa seguirá. A ata de fundação, outro documento indispensável para criação de uma EJ, surge a partir desses encontros. Deve-se constar na ata, entre outros, dados pessoais dos primeiros diretores eleitos, período de mandato e lista de todos os membros.

Outro documento importante para toda empresa júnior é a Relação Anual e Informações Sociais (Rais). É por meio do Rais que as EJs atestam, junto ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que não possuem nenhum tipo de vínculo trabalhista com seus membros. Esse documento deve ser preenchido e declarado anualmente.

Além dos documentos citados acima, para o funcionamento de uma EJ, também serão necessárias formalidades como:

  • Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ);
  • Ficha Cadastral de Pessoa Jurídica (FCPJ);
  • Certidões negativas de débitos relativos a tributos federais; 
  • Conta bancária ativa;
  • Livro diário (registro das movimentações contábeis da EJ); 
  • Contrato de prestação de serviços;
  • Emissão de nota fiscal. 

“Uma experiência de mercado enquanto a gente está fazendo a graduação”

Larissa Rocha é formada em engenharia civil pela UFCA e é uma das fundadoras da Projetta Jr – EJ vinculada ao curso de engenharia civil da instituição. Larissa ingressou na universidade em 2013, formou-se em 2018 e, alguns anos depois de formada, retornou como docente substituta. A professora explica que a Ata de Fundação da Projetta é de 16 de janeiro de 2016, mas a ideia de criação da empresa veio um ano antes, em 2015. 

Larissa foi uma das primeiras assessoras financeiras da Projetta e, em seguida, assumiu a diretoria de finanças. Foto: Davi Moreira – Dcom/UFCA

De acordo com ela, alguns de seus colegas de turma participaram de um intercâmbio nos Estados Unidos e tiveram a oportunidade de conhecer uma EJ na área da Construção Civil. Após essa experiência, segundo Larissa, eles entenderam que criar uma empresa júnior vinculada à engenharia civil na UFCA faria com que os graduandos dessa formação tivessem uma aproximação maior com o mercado de trabalho.

“Quando eles retornaram [para o Cariri], como tiveram esse contato e viram o quanto isso foi importante para gestão da futura profissão que eles iriam exercer, eles voltaram com essa possibilidade [de criar uma EJ]. A gente, então, começou a se reunir para montar o estatuto social no fim de 2015. Eu já tinha passado por todo ciclo básico de engenharia civil e já tinha um pouco de experiência profissional, porque já tinha começado os estágios”, disse.

Larissa foi uma das primeiras assessoras financeiras da empresa e, em seguida, assumiu a diretoria de finanças – cargo que ocupou até 2018, quando concluiu o bacharelado.

Para oficializar a criação da empresa, contudo, Larissa explica que foi necessário a participação de um docente que se responsabilizaria pela iniciativa. À época, o professor Vicente Helano era quem respondia pela empresa: “Eu participei do primeiro projeto elétrico que a Projetta fez, lá em 2016. Todas as atividades e todos os projetos passam pela revisão dos tutores, até porque os projetos precisam da assinatura de um profissional responsável, bem como da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART)”, afirmou.

A Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) identifica o responsável por um serviço ou uma obra. A Lei Nº 6.496/77, nesse sentido, determina que contratos para execução de obras ou prestação de serviços referentes à engenharia, à arquitetura e à agronomia devem dispor do documento – emitido pelo Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea).

Larissa enfatiza que, antes da conclusão da graduação e de estarem cadastrados no Confea, os estudantes não podem assinar os projetos e nem assinar a ART. Dessa forma, o professor-tutor é quem vai revisar o trabalho feito pelos membros da EJ e auxiliar em questões burocráticas. Em EJs recém-criadas, o professor-tutor também pode ser visto como o principal elo com a comunidade externa à instituição.

Em relação às questões burocráticas, Larissa lembra que a Projetta só conseguiu ter um CNPJ alguns anos depois de sua fundação: “Inicialmente, a gente fazia os projetos e eles eram assinados e saiam como um projeto do engenheiro-tutor. O CNPJ tem um valor que, no início, como a empresa estava começando, a gente não tinha [como pagar]”, ressalta.

No que diz respeito a captação de valores, as empresas juniores ofertam serviços com preços menores que os praticados pelo mercado e os valores arrecadados pela prestação desses serviços devem ser reinvestidos na formação e na capacitação dos membros que delas participam, já que esses integrantes exercem trabalho voluntário e fazem parte de uma associação sem fins lucrativos. 

“Uma empresa bebê ainda”

Luiza Jamile é uma das integrantes da EJ recém-criada no curso de engenharia de materiais da UFCA – a Solucionare. A discente está no último ano do curso e, na Solucionare, faz parte da equipe de “Gestão de Pessoas e Processos”, responsável pela parte administrativa da empresa.

Ela explica que, embora a ideia de criação da empresa júnior seja antiga, ela só se concretizou em abril de 2023, por meio de esforços do centro acadêmico do qual ela também faz parte. Por falar em centros acadêmicos, eles foram tema de estreia da série “Protagonismo Estudantil”, em 2022.

“A ideia da Solucionare já é antiga, desde os primeiros centros acadêmicos do curso de engenharia de materiais, mas o desenvolvimento dela e [sua] estruturação, de fato, foi no centro acadêmico passado. É uma empresa nova, uma empresa bebê ainda. Ano passado, como eu estava na gestão do centro acadêmico, a gente decidiu se dividir em equipes. Então, alguns membros do CA ficaram para desenvolver a Semana de Engenharia de Materiais e outros membros, para dar início a fundação da empresa júnior. Eu estava nessa equipe de fundação”, comentou Jamile. 

Luzia Jamile, discente do curso de engenharia de materiais da UFCA. Foto: Davi Moreira – Dcom/UFCA

Conforme a estudante, as liberações necessárias para a Solucionare, de fato, entrar em atividade durou cerca de um ano –  em especial o CNPJ. Jamile afirma que, no início, a empresa júnior de engenharia de materiais era composta por cinco membros – todos também participavam do centro acadêmico. Pouco mais de um ano depois, a Solucionare já conta com 13 integrantes. 

Durante o processo de fundação da empresa, identificou-se que a Solucionare já tinha um estatuto social. A partir disso, como explicou Jamile, a equipe responsável por criar a empresa júnior seguiu, então, para a construção do regimento interno e dos demais documentos necessários para o funcionamento da EJ – como os editais para processos seletivos. 

Integrantes das outras EJs existentes na Federal do Cariri também compartilharam com a Solucionare suas experiências e ajudaram a equipe da EJ de engenharia de materiais: “Elas são empresas juniores que a gente sabia que já tinha um certo conhecimento de como funcionava o movimento [das EJs]. Fomos em busca de alguns desses participantes e eles nos auxiliaram muito [na parte burocrática], além de termos contado com a ajuda de alguns servidores da UFCA, inclusive de outros cursos”, pontuou Jamile.

O principal foco da Solucionare é a caracterização de materiais (examina as estruturas de um determinado material), mas a empresa também oferta serviços como ensaios mecânicos (usados para o controle de qualidade) e otimização de materiais (método focado na eficiência do material e na redução do tempo de produção e dos custos do produto).

Como a carta de serviços é baseada em análises da estrutura e da resistência dos materiais, Jamile afirma que a Solucionare faz uso frequente dos laboratórios disponíveis no curso – Caracterização, Metais, Polímeros e Cerâmicas. Jamile frisou, ainda, que os serviços ofertados pela Solucionare foram criados com auxílio dos docentes e dos técnicos da graduação em engenharia de materiais da UFCA.

Sobre a prospecção de clientes para a EJ, Jamile comenta que durante a fundação da empresa, alguns clientes já haviam procurado pelos serviços da Solucionare, mas  que a equipe busca ter um contato mais próximo com os clientes: “Para prospectar, a gente manda e-mails, liga e também vai até as empresas para ter um contato mais pessoal, o que, de fato, é bem melhor. Às vezes, a conversa flui melhor [quando o contato com o cliente ocorre presencialmente]”, complementou.

EJs como projetos de Extensão na UFCA

Algumas empresas juniores da UFCA, como a Solucionare e Projetta, também estão cadastradas na universidade como projetos de extensão. Os projetos extensionistas são gerenciados pela Pró-Reitoria de Extensão (Proex/UFCA). Em 2023, a extensão universitária também já foi tema da série “Protagonismo Estudantil”.

De acordo com Jamile, inscrever a EJ como um projeto de extensão é uma das alternativas encontradas pelos discentes para que eles consigam cumprir a carga horária mínima dedicada à extensão: “A gente teve um contato com a Proex para, justamente, acertar essa questão das horas; como iria funcionar para que os membros da Solucionare conseguissem cumprir essa carga horária. O professor-tutor também é a ponte entre a proex e a gente”, declarou.

Jamile se refere acima ao processo de integralização da Extensão, que consiste na inserção de ações extensionistas nos currículos dos cursos de graduação das Instituições de Ensino Superior (IES) de todo o país. Juntas, essas ações devem representar pelo menos 10% da carga horária total do curso.

“Um caminho para conseguir o primeiro emprego”

Como empresas, é natural que algumas EJs fiquem inativas por um tempo e seja necessário que elas passem por um processo de reestruturação para que suas atividades sejam retomadas. Algo semelhante ocorreu com a Práxis Pública – empresa júnior criada em 2016, ligada ao curso de administração e gestão social da UFCA. 

Leirivane Viana, estudante do sétimo período de administração pública e gestão social na UFCA, participou da EJ de seu curso justamente durante esse processo de reabertura da empresa. Ela é natural de Itarema (a 211 km de Fortaleza), no norte do Ceará. A estudante ingressou na universidade em 2021 (mesmo ano em que decidiu integrar a Práxis) e ficou na equipe da EJ até 2023.

Leirivane Viana participou da Práxis entre 2021 e 2023. Foto: Davi Moreira – Dcom/UFCA

Recém-saída do Ensino Médio, Leirivane disse que um dos motivos que a fez participar da Práxis foi a oportunidade de adquirir experiência profissional e, posteriormente, conquistar o primeiro emprego: “Eu escolhi a empresa júnior porque os meninos que estavam reativando a empresa disseram que poderia ser um caminho para conseguir o primeiro emprego. Como eu vinha de outra cidade e tinha acabado de sair do ensino médio, eu vi como uma oportunidade de ganhar experiência”, frisou. 

Leirivane entrou na empresa como trainee e o treinamento durou três meses. Após esse período, ela foi efetivada e assumiu a diretoria de “Gente e Gestão”. Ela explica que, como o próprio nome indica, esse setor dentro da EJ está relacionado ao gerenciamento de pessoal e funciona tal qual um RH – desenvolvendo atividades como a criação e o gerenciamento de editais e de processos seletivos. 

Segundo a estudante, a EJ de administração pública tinha passado por uma desativação e a equipe da qual ela fez parte foi responsável por reativá-la: “Quando eu entrei na Diretoria de Gente e Gestão, praticamente, eu comecei a reestruturar esse ‘setor’ dentro da empresa, porque não havia nenhum documento, nenhum dado que pudesse direcionar a própria diretora de Gente e Gestão. A partir disso, começamos a criar material, tanto para o processo seletivo quanto para o bem-estar dos integrantes”, conclui.

Durante o tempo em que passou na empresa, a estudante fomentou a criação de registros que pudessem nortear equipes que viessem a integrar a EJ futuramente. Nesse sentido, Leirivane ressalta que, entre 2021 e 2023, todos os esforços estavam direcionados para a reativação da Práxis. Foi apenas a partir do fim de 2023 que a EJ passou a vender serviços e prospectar novos clientes.

Em suma, os serviços da empresa júnior de administração pública é baseada na venda de cursos de formação, consultorias e assessorias voltadas para gestão pública. Um dos exemplos de serviços da EJ, citado por Leirivane, é um curso sobre licitações com foco na nova regulamentação do governo federal (Lei 14.133, de abril de 2021). A nova lei foi sancionada para tornar os processos licitatórios mais transparentes e menos burocráticos.

Movimento Pós-Juniores

Os estudantes que participaram das empresas juniores durante suas formações passam a ser considerados “Pós-Juniores”.

O Movimento Pós-Júnior reúne aqueles que já contribuíram de alguma forma para o movimento das EJs no Brasil e tem o intuito de fortalecer o movimento, por meio da construção de uma rede nacional de contatos, de encontros colaborativos e de capacitações. Dhefesson, Larissa e Leirivane já fazem parte do movimento pós-júnior.

Segundo Dhefesson, os pós-juniores sempre saem com uma bagagem emocional muito grande quando se formam, mas continuam acompanhando de perto os passos de seus colegas: “A gente se conecta muito com as pessoas, desenvolvemos um senso familiar muito grande. Então, essa comunicação posterior com quem ainda está nas EJs é extremamente importante, porque é ela que faz com que o movimento cresça”, finalizou.

Serviço

Diretoria de Comunicação
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